Some people say that our country is the face of Europe, regarding our geographic position, but I think they're mistaking it for the rear end.
sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008
Quoting Myself
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008
Pink Lady in the Blue
Da luta contra o preconceito pode surgir por vezes uma agradável surpresa, não há garantia de isso acontecer sempre mas no caso desta peça tenho que admitir que o medo inicial era sem fundamento, pelo menos em relação a alguns elementos que foram responsáveis pelo surgimento da mesma. Eu não acreditava que a peça valesse a pena, a começar pela dificuldade do tema abordado, doença terminal de uma criança, Óscar, e a consequente tentação de se resvalar para a lágrima fácil. Felizmente a peça não explora esse filão, pelo menos de um modo óbvio, mas cai noutro tipo de erro, nomeadamente a facilidade com que resolve o problema da morte através do uso comum de deus e do consolo da sua presença. Não é que esse consolo não seja legítimo, mas é redutor e deixa de fora muitos espectadores, que não podendo recorrer a esse consolo, ficam sem alternativas para o mistério da morte. A dor no ser humano quase nunca é uma reprodução das provações de Cristo na cruz (ou fora dela), e não o será nunca quando estamos a falar de uma criança que apesar de muito doente ainda possui o conforto, possível, do humano e da medicina. A peça é construída a partir de uma série de cartas escritas pelo menino e dirigidas a deus. O tom oscila entre o infantil e o patético e, mesmo salvaguardando que o infantil até pode ser patético, neste caso as cartas parecem ter sido escritas por um adulto com problemas cognitivos e não por uma criança. Essa subtil diferença fere a peça de morte e deixa-nos a olhar para o vazio, que até podia ser a ausência de deus perante o sofrimento humano, mas que não passa do vazio de ideias do autor, Eric-Emmanuel Schmitt.
No entanto há que ser justo e realçar a honestidade com que a actriz, Lídia Franco, trabalha o texto fazendo um trabalho exemplar, isto com o auxílio precioso da encenadora, a americana Marcia Haufrecht. Para além das falhas inerentes ao texto o espectáculo é uma agradável surpresa por isso mesmo, porque estamos perante uma honesta peça de teatro e se o texto é medíocre a culpa não pode ser imputada à actriz, mesmo que ela o tenha co-traduzido e escolhido.
Óscar e a senhora cor-de-rosa de Eric-Emmanuel Schmitt encontra-se em cena no Teatro Nacional Dona Maria II até ao dia 30 de Março de 2008.
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008
Measuring Words
"Quero aqui declarar que nunca comi uma francesinha como nunca comi túbaros"
Alexandra Lucas Coelho
In Público
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008
Turismo Infinito
Viajar no universo Pessoano não exige vistos, carimbos de fronteira ou vacinação prévia contra doenças exóticas e também não é necessário qualquer mapa, ou para sermos mais modernos um GPS, até porque a geografia interior deste poeta é mesmo infinita e o mais certo seria perdermo-nos durante essa viagem. A entrada nesse peculiar mundo literário pode ser involuntária mas nunca é feita sem a companhia, múltipla, dos heterónimos e homónimo do maior poeta europeu do século XX. Esta adaptação teatral dos textos de Pessoa poderia cair na tentação de se deixar confundir com um recital de poesia, mas tal nunca acontece porque para além da poesia os actores, que encarnam as múltiplas facetas do poeta, conseguem criar de um modo eficiente a ilusão da tridimensionalidade dos heterónimos e do próprio Pessoa. Num cenário minimalista, negro e inócuo recria-se aquilo que poderá ser um escritório, mas um escritório de onde é possível às personagens viajar, metaforicamente sentados, em confortáveis assentos de um qualquer, metafísico, transporte público.
Em relação à trindade heterónima, que escreve poesia, temos em palco o futurista Álvaro de Campos e o mestre bucólico Alberto Caeiro, de fora ficou o heterónimo neo-pagão, Ricardo Reis, mas no seu lugar ficamos com duas originais criações Pessoanas, embora uma delas seja real, podem ambas não ter passado de recriações nascentes da necessidade de viver o amor como se espera do poeta “fingidor”, uma Ofélia Queirós, mulher de carne e osso mas também fruto da imaginação e recriação do poeta e outra, talvez o duplo feminino de Pessoa, a marrequinha Maria José.
Neste caso o turismo é infinito porque as abordagens aos textos de Pessoa também podem ser infinitas, esta peça apresenta-nos uma das trajectórias possíveis, se se preferir uma das leituras possíveis, mas não deixa de ser interessante constatar que de modo algum é sequer insinuado que possa ser a leitura definitiva, e é precisamente por isso que a dramatização destes textos ganha força. É um pequeno rasgão nas paredes do universo do poeta através do qual nos é permitido espreitar uma fracção do seu tempo infinito.
Esta peça, encenada por Ricardo Pais, esteve em cena no Teatro Nacional Dona Maria II e agora encontra-se em digressão pelo País.
domingo, 10 de fevereiro de 2008
Oscar It! but it won't make it any better...
O tema da inocência que perversamente pode ser um instrumento ao serviço do mal é sem dúvida fascinante. Neste caso temos Briony uma pré-adolescente com uma imaginação muito fértil e acesso a elementos ainda fora do seu alcance de compreensão mas que ao mesmo tempo se julga suficiente adulta para julgar e condenar prontamente os outros. Briony é uma criação do escritor Ian McEwan e é uma herdeira directa das personagens que habitam os romances de Jane Austen tal como é insinuado na citação que nos surge antes do início do romance. Neste filme, Expiação, ela encontra-se decalcada fielmente, aliás como todas as outras personagens e situações imaginadas pelo escritor. A adaptação de Christopher Hampton é perfeita, para alguns demasiado perfeita porque deixa pouco espaço à imaginação cinematográfica. Quem leu o livro não vai ficar desapontado a não ser que não tenha gostado muito do livro e nesse caso não é o objecto filmico que está em causa mas o objecto literário, até porque o primeiro é uma cópia quase exacta do segundo. A escrita de McEwan nunca se distância muito daquilo que é um romance, infelizmente não na tradição de Jane Austen, mas na tradição de Barbara Cartland, claro que com alguma pretensão intelectual. E nem o twist final acrescenta muito à dimensão dramática da estória que, embora possa ser surpreendente em retrospectiva, vem a revelar-se como uma muito fraca forma de expiação, isto porque não existe nenhuma forma de auto comiseração, nem a literária, ainda por cima apresentada deste modo, que sirva esse propósito quando o que está em causa é a vida de um ser humano. Na minha opinião Ian McEwan deve ser um dos escritores mais sobrevalorizados da sua geração, que publica regularmente e é muito popular nos países anglo-saxónicos e mesmo em Portugal, mas a sua escrita é pastosa, pesada, nunca levanta voo e encontra-se presa ao que de pior existe na tradição inglesa, não passando, na maioria das vezes, de um pastiche pouco conseguido da melhor tradição da escrita que tem tido origem nas ilhas britânicas.
Por isso o filme sofre do mesmo mal do livro tornando-se assim num objecto feito à medida dos leitores, ou potenciais leitores, do escritor mas que não irá muito mais longe independentemente da competência técnica e criativa das pessoas envolvidas na sua realização.
sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008
Lápis Lazuli
Quer se goste ou não do tom da crítica a censura é um gesto muito pouco civilizado por isso aqui fica o texto da Dóris Graça Dias como forma de protesto. Para quem não saiba é uma crítica sobre o último livro do Miguel Sousa Tavares, O Rio das Flores, cuja publicação foi rejeitada pelo Expresso.
A Redacção
Perdoe-se a franqueza. Há «parti-pris» que batem certo, mas para que a relativa se comprove, há que analisar o objecto sob suspeita
Anunciada como obra de mais de 600 páginas, com uma tiragem de 100 mil exemplares, esta, antes de ser já o era: «As pré-vendas on line do novo romance de Miguel Sousa Tavares, Rio das Flores, registaram mais de mil encomendas durante as primeiras 24 horas, um facto inédito para um autor português. O livro, cujo lançamento está marcado para dia 25 de Outubro, só chega às livrarias no dia 29.» Informava a editora a 19 daquele mês. Fomos pesá-lo numa simples balança de cozinha – fazia-nos falta este elemento informativo: 900 gramas. Suspense, marketing, quantidade, peso... faltava só verificar o que em literatura parece ser perfeitamente secundário: a qualidade.
Isso aí, isso aí... já nos parece mais subjectivo. Será? Comecemos pelos pastiches. E que tal uns «vencidos da vida» transpostos para fins de 1920? Não se chamam Carlos nem Ega, mas enfim, ecoa ali Eça que é um mimo. E um cheirinho a faenas, a caça às perdizes – tão do gosto da pessoa do autor (que maldade confundir egos e alter egos, mas há quem se ponha a jeito) –, coisas de homem, muito lido em Hemingway (cá entre nós, que ninguém nos ouve, um Nobel uma bocadito forçado)? Mas enquanto Hemingway nos faz balançar e zangar nos nossos «parti-pris» (mais uns) relativamente a touradas, caçadas, pescarias e coisas afins, com MST ficamos na mesma. Nenhuma simulação de exaltação, nenhuma garra, nenhuma inspiração; o que temos é uma morna descrição de gestos pouco cinematográficos, um descritivo meio jornalístico, longínquo ainda do despachado Hemingway.
E por falar em descritivo meio jornalístico, este romance, que nas palavras do próprio autor se deseja histórico, quando entra por esse caminho, regista um tom de Selecções do Reader’s Digest. Por vezes, parece que estamos numa sala de cinema nos anos 60, vendo e ouvindo os registos informativos que a censura nos impingia antes de um qualquer Música no Coração; outras, lembra-nos certos programas televisivos em que vemos imagens em movimento muito queimadas de um qualquer «raid» aéreo da 2ª Guerra Mundial acompanhadas de sínteses vocálicas bem colocadas mas, contudo, sínteses.
Quanto às variantes descritivas de centros históricos, áreas urbanas, edifícios-chave, o tom é de prospecto turístico, onde não falta a curiosidade histórica, a anedota com personalidade internacional, a listagem de um menu, estilo: quando ir, como ir, onde ficar, o que e onde comer. Já agora convém referir que os citados hotéis Negresco e Carlton ficam, respectivamente, em Nice e em Cannes, daí que dizer que o arquitecto francês Joseph Gire, autor da «arquitectura do Copacabana Palace [se inspirara] nas do Negresco e do Carlton, de Nice» (pág. 327) tem qualquer coisa, no mínimo, de precipitado. E inútil, já que quem conhece, conhece; quem não conhece, fica na mesma.
Romance, romance... como a palavra anda desgastada. Quanto mundo é preciso percorrer, aprender, ter para escrever um romance. Quanta atenção é preciso despender, quanta imaginação converter, quanta distância compreender. Criar personagens não se basta por um acumular de lugares comuns, somando diferenças ilustrativas de tipos; há que não ser anacrónico na linguagem, nas exigências existenciais, nos enquadramentos territoriais. Se se pretende descrever uma mulher, convém olhar bem para elas, sob pena de se ser apenas grosseiro, quando se pretendia ser airoso. Para escrever um romance há que ser um «flâneur» e não um «poseur». Ou seja: perder-se e não julgar-se, à partida, encontrado.
Tudo o que MST disser sobre a sua própria escrita, o seu romance histórico é gratuito. Que o escreveu a pedido de muitas famílias, que passou três anos muito duros, quase dois a documentar-se e um fechado em casa a escrever, sem viajar: nada disto interessa a um leitor; nada disto interessa à literatura. É exactamente esta inversão de valores que faz de Rio das Flores uma obra menor, tão igual a um qualquer exercício de menino de escola semi-deitado de lado sobre o papel, trincando a língua num esforço de saliva e olhos estrábicos confluindo no bico da caneta. «Bela Redacção!»: diz o professor, relativizando o esforço e a idade do garoto.
Mas MST não é um garoto e se quer usar o seu nome, devia exigir mais de si do que a simplicidade de uma obra pretensamente bem engendrada. Em literatura isso não existe. Se pretende fixar história, nada como perder três, seis, doze anos a estudar uma época, para a registar – em 100 páginas; se quer escrever um romance, nada como reflectir sobre o que é a literatura, ler muito, e bem, que é como quem diz: perder-se. E se nunca se conseguir encontrar para escrever, ninguém lho levará a mal!
Dóris Graça Dias
Desafiando as regras
Nalgumas circunstâncias é bom deixar passar algum tempo até que se possa reavaliar um filme, foi o que fiz propositadamente com esta película da chamada New wave do cinema romeno. 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias é um objecto perturbante, social e moralmente, e embora se passe na Roménia no ano de 1987, antes da queda de Ceausesco e dos regimes comunistas de leste, encontra-se impregnado de uma universalidade que cria uma dimensão, em abstracto, que permite transladar muitos momentos para a nossa sociedade contemporânea e assim questionar determinados valores que tomamos como dados adquiridos. Numa entrevista do realizador é-nos desvendado que era recorrente usar o aborto como uma forma de protesto social, que poderia ser visto como um desafio às instituições do estado e ao regime. No entanto isso nunca é assumido no filme arrastando-o para uma ambiguidade que permite centrar o drama nas personagens e não tanto no gesto que as move.
A estória resume-se em poucas linhas mas neste caso é contada de um modo tão eficiente e original que nos desarma constantemente. Vamos acompanhar o gesto clandestino de duas jovens, uma que quer fazer um aborto e outra que ajuda a amiga, mas em vez de nos fazer fixar no olhar da mulher que quer abortar o realizador faz-nos acompanhar a amiga, aquela que toma decisões e faz o “trabalho sujo”.
Para além da leitura moral, na qual se pode cair com alguma facilidade, o filme depende essencialmente do factor humano, da dimensão heróica, ou anti-heróica, da personagem que vamos acompanhando através de longos takes de imagem fixa, de cujo enquadramento por vezes saem as personagens sem nos pedir licença, continuado a acção para além do nosso olhar, o qual fica preso involuntariamente num enquadramento estéril em termos de acção. Esta escolha consciente do realizador serve para ampliar a sensação de impotência e claustrofobia na qual as personagens vivem e que é reforçada pela cena inicial e final do filme. Na primeira cena é-nos dado a ver dois peixes num aquário quase sem água, e na cena final as duas mulheres olhadas através da montra de vidro de um restaurante de hotel, quatro seres vivos sem saída que habitam prisões diferentes
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008
Trama
Na minha primeira visita à livraria Trama comprei a “Diabolíada” de Mikhaïl Bulgakov editado pela & etc em 2006. Um retrato do diabo encarnado em funcionários de repartições do Estado cujos gestos nos ultrapassam sempre porque situados para além da nossa capacidade de compreensão e neste caso exponenciados pela delirante imaginação deste genial escritor que seguindo a tradição do que de melhor nos és dado a ler na literatura russa e europeia, ora piscando um olho a Gogol ora outro a Kafka, sem nunca perder o equilíbrio das palavras que assentam num humor que oscila entre o subtil, o surreal e o fantástico.
O livro apresenta como prólogo uma excelente biografia deste autor que nos deixou também como legado a obra-prima “Margarita e o Mestre”.
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008
The Meaning Of Life
Existem filmes que se encontram limitados pelas suas próprias ambições como acontece com a última película realizada por Sean Penn, Into the wild, na qual se conta a estória da procura, por um indivíduo, daquilo que se imagina relevante para o ser humano. No entanto o modo como o realizador conta esta estória sofre dos limites inerentes à cultura onde se insere e se por um lado assumir esse facto poderia trazer mais peso à mensagem associada ao filme, a sua tentativa de escamoteação só serve para o enfraquecer. Existe o risco, redutor, de sermos levados a pensar que Christopher McCandless (Emile Hirsch) no fundo só está à procura de uma nova família para substituir aquela que abandonou, e com a qual viveu as, infelizmente cada vez mais comuns, experiências traumáticas do divorcio, neste caso condimentado com cenas de violência doméstica, traição e algum estigma social. Revelam-se assim as hipocrisias que emanam do tecido social perante as quais todos nós somos obrigados a nos vergar quando entramos na realidade que nos é dada viver. Christopher decide rejeitar essa aceitação passiva e parte numa aventura que é também uma busca da sua verdadeira essência como ser humano, e se o filme ficasse só por aí seria um objecto muito eficiente de reflexão social. Tal não acontece e na presença de uma moralidade bacoca a mensagem perde força. A começar pelo facto de não se encontrar plenamente justificado o porquê da necessidade de reforçar a ideia de ele ser um aluno exemplar, só ter notas altas em trabalhos em que disserta sobre assuntos pertinentes e para além disso ler e citar autores russos; estes factos são de algum modo usados para credibilizar o gesto radical da personagem, gesto esse que talvez, para algumas pessoas, perdesse algum impacto se nos deixasse espaço para pensar que ele afinal não seria mais do que mais um vagabundo que decide viver à margem da sociedade. No entanto essa tentativa de manipulação nada acrescenta à verdade da estória. Depois também existe a ideia inerente à sua pureza sexual, bondade, ao martírio e sofrimento, veículos no sentido da santificação que geralmente culmina num final trágico, como acontece em quase todas as biografias dos santos mártires cristãos. Infelizmente essa colagem ao mito cristão faz perder o impacto universal da mensagem, enfraquecendo-a.
Claro que na sua essência a mensagem sobrevive e é-nos dado ver um belo filme que servirá sempre como indutor de uma reflexão profunda sobre a nossa relação com aquilo que nos rodeia e sobre o que é realmente importante para nós como seres humanos.
O filme é baseado num livro homónimo escrito por Jon Krakauer, sendo a adaptação ao cinema feita pelo próprio Sean Penn.
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