quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Dia Horribilis


Hoje está a ser um dia negro para o nosso primeiro-ministro, José Sócrates, reuniões e gestão de influências pouco claras no caso Freeport, apoios pouco chorudos da comunidade europeia à recessão que pelos vistos em Portugal é menos preocupante do que nos outros países da união, citação de relatórios elogiosos à politica de educação que afinal não provêem de uma fonte independente, supostamente a OCDE, mas de um estudo encomendado pelo próprio governo, ainda os tais projectos aprovados pelo Eng. Sócrates quando funcionário na Câmara da Guarda e que têm levantado muitas suspeitas sobre quem os terá realmente assinado e ainda o facto de um tal Sr. Dr. Juiz João Pedroso, irmão de um não menos famoso Dr. Paulo Pedroso, ter andado a fazer uma “sistematização da legislação sobre Educação publicada nas últimas décadas” para o ministério da Drª Maria de Lourdes Rodrigues tudo pela módica quantia de € 287.980,00. Mas ao que parece o Dr. João, à altura do contracto, estaria a trabalhar em regime de exclusividade na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, facto ignorado tanto por ele como pela Srª Ministra, talvez porque isso implicaria receber menos 30 % do seu vencimento de docente; além do mais o Dr. João encontra-se de licença sabática para fazer/escrever o doutoramento. Confusos? Bom se para além disso ficarem a saber que o Sr. Dr. Juiz não acabou o trabalho mas que entretanto já recebeu a quantia estipulada. Revoltados? Então e se ficarem a saber que segundo o Público “Paulo Pedroso (irmão do Sr. Dr. Juiz) é colega da ministra e de outras altas figuras do Ministério da Educação num centro de investigação universitário (no ISCTE)”. Incrédulos? Então fiquem a saber que segundo a mesmo fonte o Sr. Dr. Juiz passou 28 recibos verdes, 14 pelo recebimento relativo ao trabalho para o Ministério e outros 14 não se ainda sebe bem para quê; mas para quem se encontra em regime de exclusividade é sem dúvida muito recibo verde para um homem só, mas que, não haja dúvida, anda muito bem acompanhado.
É uma tragédia que a oposição esteja a ser dirigida por um copo de leite morno esquecido há muito tempo fora do frigorífico. E nem todo o leite coalhado dá em bom queijo, nestas condições de pouca higiene, que é a política portuguesa, o mais certo é dar num queijo que há-de cheirar mal (como é apanágio) mas que infelizmente também há-de saber ao que cheira, e como é do conhecimento geral é no sabor que se encontra a verdade e qualidade do mais sofisticado produto lácteo.

Jornal de Tretas


O JL fez 1000 números e eu um pouco por nostalgia misturada com curiosidade lá fui até ao Sr. Zé, ou melhor o meu pai foi por mim, e trouxe-o com brinde de livro de poemas editados pela Leya, a editora mais glutona de que há memória em Portugal.
O jornal vinha húmido, não de prazer mas, porque hoje está um daqueles dias de chuva constante e de vento irrequieto que não poupa nem os jornais de banca embrulhados em plástico transparente; este número 1000 é auto-celebratório, auto-masturbatório, auto-reflectivo, auto-tudo-e-mais-alguma-coisa dessas coisas que servem para nos celebrar perante os outros mesmo quando, como é o caso, já há muito deixou de haver qualquer motivo de celebração.
Cada vez mais este pasquim representa um jornalismo cultural medíocre que se tenta justificar através de nomes sonantes, e defuntos, que nele, em tempos idos, escreveram. Se nos anos 80 e parte dos noventa ainda se tolerava este amadorismo intelectual que se sustenta no facto de todos os jornalistas saberem muito bem distinguir o substantivo do adjectivo e de como introduzir bem o verbo na frase, nos dias que correm isso é obviamente insuficiente. Se descontarmos os textos, repetidos, dos mais conceituados colaboradores sobra-nos uma meia dúzia de críticas a filmes, livros e cd’s que têm em comum o facto de terem sido escritos só para serem lidos pelos seus autores ou para impressionar mal a vizinha do lado, porque aos outros ajudam a acrescentar muito pouco.
O JL surgiu no pós 25 de Abril e de original sempre teve pouco porque já havia, antes da revolução de Abril, uma secção no DN, coordenada pela Natércia Freire, precisamente sobre os mesmos temas e onde houve espaço para publicação de autores das mais variadas sensibilidades estéticas e políticas. Foi lá que muitos dos mais importantes nomes da literatura portuguesa do século XX começaram a publicar, tendo esse suplemento sido saneado com a preciosa ajuda do eterno director do JL, quando os revolucionários ocuparam a sede do DN. O tempo entretanto tem servido para demonstrar que esses supostos revolucionários sempre foram mais reaccionários, criadores de um ser obeso e sedentário que se suspeita esteja há muito numa cama de Hospital em coma profundo e a um passo da morte cerebral.
Desde esses idos anos 80 que nada mudou, mas também pouco poderia, porque a miopia nessa altura ainda estava na moda e usavam-se óculos de lentes grossas para impor austeridade e credibilidade a umas páginas que muitas vezes ficavam aquém dos jornais universitários, dos anos 60, que eu suspeito serem a matriz de referência dos seus editores. Mas sem a irreverência, sensibilidade, maturidade e visão que se esperava de uma publicação que devia estar na vanguarda do conhecimento literário, musical e cientifico. E tudo continua na mesma e nem a colaboração de alguns nomes interessantes da nova literatura portuguesa chegam para revitalizar este corpo comatoso porque os órgãos vitais estão condenados por células que perderam há muito a capacidade de regeneração, eu até desconfio que nunca a tiveram.

His Life Within


Edmund White é um escritor que atingiu a maioridade literária tarde no tempo e que escreve a sua obra maior inspirado pela sua experiência de vida, e por isso poderá ser considerado como a ponte perfeita entre o romance do século XIX e o do século XXI e cuja morte entretanto foi anunciada no século XX.
“My Lifes” acerta em tudo, possui o tom, a profundidade, a ironia e o distanciamento certos entre o objecto revisitado, que é a vida do autor, e a sinceridade que até pode ser ficcionada mas que se lê sempre como genuína. Já se podia prever que a sua escrita iria ganhar com este tipo de intimidade pois a biografia sobre Jean Genet, escrita por ele há uns anos, já se encontrava espartilhada por essa sobriedade, a qual não se vislumbra nos seus outros livros, quer sejam os romances ou as mini biografias sobre Proust ou Rimbaud, não esquecendo “Le Flaneur”, pequeno livro sobre a cidade de Paris. Aquilo que fazia diminuir os seus livros, estreiteza de pensamento, obsessão pelo universo “gay” e sua potencial marginalidade, nesta autobiografia deixa de ser relevante porque assume a sua verdadeira dimensão, não distorcida pelo hastear de bandeiras pessoais ou colectivas que mal usadas servem apenas para cobrir os buracos ou remendos de uma história mal contada. Nesta autobiografia pouco fica por dizer e embora o próprio autor assuma que muitas vezes esteja a dar demasiada informação, felizmente essa lucidez não o impede de continuar e essa persistência que noutras circunstâncias poderia ser a sua maior fraqueza acaba por ser o factor que mais enriquece o livro; neste caso a verdade acaba por nos conquistar e saímos todos a ganhar, se bem que por vezes seja uma vitória que nos poderá deixar uma sensação de sujidade, mas como se está a ler uma vida até agora não se sabe de nenhuma que seja totalmente cristalina e sem opacidade ou manchas.