Quem sabe um dia vou ser assim tão grande como os blogues que por aí andam, sofisticados de conteúdo e aparência. Por enquanto deixo a perfeição para os outros, nunca me dei bem com essa tipa embora tenha passado a maior parte do tempo a persegui-la. Quando fecho os olhos vejo-a sempre de sapatos vermelhos a percorrer ruas desertas.
Chama-se Natasha e é uma loira frígida, como eu já desconfiava.
E ao que reza a estória Natasha trazia uma pistola escondida na mão direita. A posição angular do seu corpo coincidia com o turbilhão de emoções que a assaltava. Caminhava na rua que havia naufragado na noite e o piso molhado reflectia a sua sombra distorcida por poças de água iluminadas pelos escassos candeeiros posicionados milimetricamente até ao encontro com a pessoa que ela sabia estar ao fundo da avenida.
O ar estranhamente não cheirava a humidade, e era inodoro, ela julgou que ainda estava na Passerelle, que aquela rua era apenas um prolongamento do seu trabalho, até lhe parecia ouvir ainda a música de elevador que a acompanhou no último desfile.
Ao fundo já via o reflexo do brilho dos óculos dele, respirou fundo, acariciou novamente o gatilho da pistola, como se estivesse a amansar uma fera. Quando chegou ao pé dele sentiu que ele se preparava para a beijar mas ela não lhe deu qualquer hipótese, sacou da pistola e disparou, ali mesmo, a sangue frio antes mesmo de o ouvir dizer boa noite. O corpo dele caiu imediatamente e ela sentiu um calor intenso subir-lhe até às faces, agora muito ruborizadas, tão vermelhas como os sapatos que ele se atrevera a criticar quando se conheceram há uma semana.
Natasha pensou: Agora já aprendeste que não se deve criticar o que vestem as mulheres, nem comentar sobre os seus caprichos. Bem feito, é para aprenderes.
Pensou, mas não o disse porque afinal achou que já não valia a pena. Ele parecia estar mesmo morto. Descalçou os sapatos vermelhos, que fez questão de trazer mais uma vez para o derradeiro encontro, e deixou-os ali, como flores numa campa. Assim descalça, foi para casa com um sorriso nos lábios.

Sim fui morto pela perfeição. Quem se atreve a criticar a perfeição. Foda-se, que sofisticado este revólver.
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